quinta-feira, 2 de agosto de 2007

COMPETÊNCIAS PARA QUE E PARA QUEM?

Reflexões elaboradas a partir da mesa temática: “ O mercado da educação e a educação do mercado” realizada no IV Congresso Internacional de Educação/UNISINOS (31 – 02 setembro de 2005).

Qualidade total, modernização da escola, adequação do ensino à competitividade do mercado internacional, nova vocacionalização, incorporação das técnicas e linguagens da informática e da comunicação, abertura das universidades aos financiamentos das empresas, pesquisas práticas, utilitárias. Produtividade: este é o discurso sedutor neoliberal para a educação.
É preciso perguntar: esta nova vocacionalização serve para que e para quem?
A modernização acelerada, a reforma educacional aumenta o poder de inculcação por meio do consenso ideológico, apresentando uma face progressista porque atrelada a uma “nova ordem mundial”. Isto significa garantir um máximo de liberdade ao mercado com um mínimo de direitos sociais. A nova ordem mundial impôs esta lógica própria do neoliberalismo. Não é próprio do cidadão acreditar que isto é natural.
“Não diga nunca: isto é natural” (B. Brecht)

1) ESCOLA E MERCADO: A LÓGICA DAS COMPETÊNCIAS.

O discurso de que a educação será a solução de todos os males da pobreza, violência e do subdesenvolvimento quase nos convence: vamos mal porque nossa educação vai mal!
No credo neoliberal do mercado absoluto e da sociedade do conhecimento a educação é proclamada como bem-capital mais importante. As mudanças vertiginosas que vivemos são atribuídas ao poder das novas tecnologias da informática e da globalização dos mercados financeiros. Isto faz acreditar num novo mundo, unificado e uniformizado que exige um suporte de “pensamento único”. Mercado e comunicação (ou informação) são os grandes modelos indiscutíveis aos quais todos devem se adaptar e submeter. Esta é a lógica impiedosa do mercado total. Também serão submetidas as esferas do trabalho e da educação.
O trabalho, atrelado à lógica do mercado globalizado é reduzido às suas dimensões instrumental e comercial. O mercado passa a comandar os critérios de classificação dos empregos ou postos de trabalho – abrindo alguns e extinguindo muitos. O mercado define as qualificações e o valor-preço da força de trabalho e suas modalidades, instalando a nova era do emprego: o do mínio da “flexibilização”. Em decorrência, a escola se transforma em uma empresa “flexível”, produtora de trabalhadores dotados de “competências”. A naturalização da onipotência da empresa e do mercado define as aptidões técnico-profissionais e as atitudes comportamentais que a Escola deve viabilizar: disto depende a “empregabilidade” dos profissionais preparados pela escola. Se o mercado dita o perfil e as competências do trabalhador que necessita, a escola o prepara nesta lógica, ele deverá sair-se bem, caso contrário, o problema é do profissional.


“Configura-se, assim, um sistema de ensino regido pelos princípios de eficiência, competitividade e flexibilidade que, através de um processo neo-taylorista contínuo, forma recursos humanos multiusos, disciplinados, informatizados e recicláveis, ou seja, um novo tipo de trabalhador capaz de garantir um fluxo de trabalho contínuo e variável, conforme o nível de atividade das empresas empregadoras” (CASTRO, 2004, p 79-80).

Esta nova organização do trabalho, a nova lógica perversa e o seu discurso apagam da memória e da linguagem dos trabalhadores termos como operário assalariado, proletariado, burguesia, exploração capitalista, luta de classes, capitalismo monopolista ou imperialismo financeiro.

2) A ILUSÓRIA VALORIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO.

O pleno controle do trabalho pelo capital e o discurso do capital onipotente faz com que a educação forneça formação continuada atrelada às novas competências; isto é, formação flexível para sujeitos semi-automatizados para desenvolver trabalhos fluidos, mutáveis para resultados sob controle de “qualidade”. Níveis maiores de escolarização não garantem melhores oportunidades de emprego nem acesso mais fácil aos direitos sociais e aos bens sociais. A retórica oficial da centralidade da educação para garantir crescimento econômico e emprego é falaciosa. O que existe, de fato, é uma tremenda crise no mundo do trabalho e do emprego.

A noção de competências deriva da afirmação básica de que existe uma grande diferença entre preparo técnico e educacional do trabalhador e o envolvimento efetivo do mesmo na realidade prática do trabalho ou mesmo da vida social. O termo competência tem sido utilizado para identificar, classificar e nomear capacidades pessoais de operacionalização e de efetivação eficiente desses recursos diante de situações concretas do trabalho e da vida social.

“No contexto atual da crise do trabalho e do capital, esta noção vem compondo, ao lado de outras como, qualidade, excelência, competitividade, empregabilidade, trabalhabilidade, laboralidade, uma orientação discursiva e proposições que têm sido utilizadas como eixo normativo na elaboração e implementação de políticas voltadas para o trabalho, o emprego e a educação. Ela tem sido utilizada como um dos instrumentos de transformação de comportamentos institucionais e individuais orientada à adaptação ao contexto social atual,caracterizado por profundas modificações nos processos concorrenciais no mundo do trabalho, nas formas de regulação da relação entre oferta e demanda de força de trabalho e nas estratégias de mobilização e de gestão dos trabalhadores”.(MACHADO,2002, p 93).

No desemprego estrutural que a nova realidade do trabalho, das novas tecnologias e da globalização; na nossa gestão do trabalho e do emprego surgem duas dinâmicas.

“A da flexibilização das relações de trabalho e dos direitos sociais adquiridos e a que impõe a prerrogativa de um conceito de qualidade que significa na sua essência aumento de controle sobre ganhos de produtividade e de lucratividade, a despeito da sobrecarga e intensificação do trabalho dos que conseguem barganhar sua força de trabalho e das dificuldades de sobrevivência da maioria crescente dos que nem chegam a isso”. (MACHADO, 2002, p. 94)

No Brasil existem dezenas de dispositivos legais exigindo a implementação das competências no campo da educação e em decorrência, inúmeros projetos político-pedagógicos de cursos, faculdades, Universidade e escolas implantando, sem nenhum constrangimento, esta lógica e estes procedimentos. São os economistas ditando as orientações da Educação aos educadores.

Isto não desmerece a luta incansável da Educação de qualidade social para todos e em níveis cada vez mais elevados como condição de melhor realização humana e cidadã dos indivíduos e da sociedade. Sem negar a realidade básica de organização do trabalho e as relações de produção, precisamos propor uma educação para além do capital e não atrelada ao sistema do mercado.
Então desconfiemos sempre, na educação se surgirem apelos para competências, competitividade, emprendedorismo, talentos, profissionalização docente, inclusão/exclusão social, equidade, controle de qualidade, globalização, homogeneização de processos, avaliação, eficiência e eficácia, sustentabilidade e excelência, multiculturalismo, liderança, gerenciamento e reengenharia.
Podemos não estar entendendo a mesma coisa. Duvidemos sempre e perguntemos: isto é bom para quem?! E por quê?!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CASTRO, Ramon Pena. Escola e Mercado. Revista Perspectiva, UFSCar. Vol. 22, no 01, 2004, p. 79 – 80.
MACHADO, Lucilia. A institucionalização da lógica das competências no Brasil. In Revista Pró-Posições, vol. 13, no 01 (37), jan-abr. 2002, p.93.

2 comentários:

teste disse...

Parabéns pela belíssima idéia de compartilhar conosco as suas reflexões!!!!

Abraço,

Taís Schmitz
(UNISINOS)

Unknown disse...

Olá Redin...
Eu sou a Jaqueline de Viçosa que conversei com você mês passado, gostaria de agradecer pelo livro.. adorei, gostei muito , confesso que achei que você iria esquecer...
Nossa fiquei muito feliz.
O meu email é jack.medina3@yahoo.com.br

quando você vir para Viçosa me avisa...
Foi muito gratificante para mim conversar com você. Espero ter outras oportunidades.

Jaqueline Medina
(UFV)